15/07/2005 – DORES E LER APOSENTAM 5 MIL POR ANO

15/07/2005 – DORES E LER APOSENTAM 5 MIL POR ANO

Lesões por esforço repetitivo respondem por 70% das doenças relacionadas ao trabalho.

Começa com uma pequena dormência na mão, que vai se tornando constante. Progride para dor e inchaço. Depois a força vai embora. A incapacidade começa, então, a rondar a vida do trabalhador e o afastamento do emprego é inevitável. Quadros como esses se alastraram como uma epidemia no mercado de trabalho brasileiro: são as doenças osteomusculares, conhecidas como LER (lesão por esforço repetitivo) ou DORT (distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho).

Cerca de 70% de todos os 62 mil casos de doenças ocupacionais registrados entre 2001 e 2003 pela Previdência Social são desse tipo e deixam inválidos, em média, cinco mil trabalhadores por ano.

Os números já seriam alarmantes observando apenas os registros de doenças ocupacionais, instrumento cada vez mais desconsiderado pelos estudiosos de segurança do trabalhador, por causa da subnotificação crônica. Mas um levantamento inédito nas estatísticas de auxílio-doença da Previdência Social mostra que são mais de 130 mil afastamentos do trabalho, em média, por ano devido, a sinovite, tenossinovite, dores de coluna, compressão em nervos da mão e antebraço, e outros males relacionados. Número bem superior aos 14 mil acidentes de trabalho de 2003.

As estatísticas, no entanto, refletem apenas a força de trabalho que tem carteira assinada. Os informais, que respondem por mais de 50% da população que trabalha, e os servidores públicos não entram nas contas da Previdência.

— Nesses números só entram os casos em que o afastamento é superior a 15 dias — diz Anadergh Barbosa, PhD em Medicina em saúde ocupacional e coordenadora do Laboratório de Saúde do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB).

Segundo a auditora fiscal do Ministério do Trabalho Lys Ester Rocha, o auxílio-doença é o caminho que resta ao trabalhador desempregado e doente. Com medo de perder a vaga para os cerca de 2,2 milhões de desempregados apenas nas grandes metrópoles, ele acaba agüentando a dor, mas perde produtividade. Com isso, é demitido e recorre ao INSS já em condições piores, pois o mal se agravou:

— As estatísticas de acidente de trabalho continuam subdimensionadas, mas as de auxílio-doença só fazem aumentar — afirma a auditora, que também é médica do trabalho no Serviço de Saúde Ocupacional Hospital das Clínicas da USP.

Família unida pela dor e pela música

Aos 29 anos, a assistente administrativa Roberta da Cunha Nogueira Soares já abandonou o sonho de cursar a faculdade de informática. Faz terapia ocupacional na mão na ABBR duas vezes por semana, na tentativa de recuperar os movimentos da mão esquerda. O tratamento veio antes da cirurgia em abril para curar a tenossinovite (inflamação no tendão) do polegar. Logo depois, o mal tomou o cotovelo e o ombro. A expressão de dor acompanha o rosto da jovem na maior parte da sessão que dura 40 minutos. Casada, não usa aliança desde setembro, quando as dores aumentaram e surgiu o inchaço.

— Sinto dor o tempo todo e, quando o tempo esfria, fica pior. Gosto do meu trabalho e quero voltar logo, mas além da dor não sinto força alguma na mão — diz.

No trabalho, foi emitida a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), mas o INSS desqualificou o documento. Com isso, Roberta perdeu o depósito do FGTS no período e a estabilidade de um ano a que teria direito na volta ao trabalho.

Unidos na música e na dor, três gerações de uma mesma família dividem o piano e os médicos. Aos 70 anos, a pianista Maria José Repsold se prepara para operar a mão esquerda. É a segunda cirurgia que fará para desobstruir o túnel do carpo. A primeira, na mão direita, foi há três anos.

— É um formigamento insuportável. À noite, piora muito. Mas consegui voltar a tocar 20 dias depois da primeira operação — diz.

A filha Mônica, de 42 anos, também pianista, convive com a inflamação nos tendões do cotovelo e em quatro dedos da mão direita. Controla a doença com terapia e acupuntura. Seu filho Bruno, de 23, baixista e estudante de piano, sentiu as primeiras dores há um ano e já está na ABBR.

Globo.com

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